quarta-feira, janeiro 14, 2009

Metáforas de um cansaço

Olhei pela janela. Os monstros do dia voavam por entre chuvas de aço queimado, enquanto a luz fugia com medo da noite.
Seguiu-se o escuro, o silêncio, e o frio. Lá fora só reflexos de cá de dentro, tudo o resto era nada.
Cá dentro, um turbilhão de palavras e sons e imagens, uma bebedeira de sentidos que combatiam entre si.
Na língua o paladar da secura que não se extingue com água. Nos olhos uma sobreposição de transparências que se transformavam em nada. Nos ouvidos, cansados dos sons do tempo em que havia luz, um zumbido que era afinal silêncio. E nas mãos o macio do vácuo que escorria pelas paredes.
Era o cansaço. O cansaço tinha tomado conta da minha sala, do meu corpo, da minha alma. E eu dormia de olhos abertos, de ouvidos atentos, de paladar apurado e tacto sensível a todas as texturas.
Amanhã acordarei para novos sons e imagens e palavras, mas por agora repouso os sentidos num papel em branco, num teclado negro, numa mesa de prata.
Por agora descanso.



O Outro - Adriana Calcanhotto

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